Paulo do Carmo Martins*
Nos dias 16 e 17 do mês passado a ABRALEITE realizou o Segundo Fórum Nacional do Leite, em Brasília. O evento veio cheio de novidades. A primeira delas é que me lembrou o Congresso Internacional do Leite, que a Embrapa Gado de Leite fez, por mais de uma década. Era itinerante e trazia sempre novidades. Neste da ABRALEITE sete pesquisadores da Embrapa palestraram. E política com p minúsculo não teve vez.
Pois, apesar de trazer no nome o termo “nacional”, o evento da ABRALEITE teve a novidade de ter sido “internacional”, com apresentações de americano, argentino e suíço. E, dos 23 palestrantes brasileiros, pelo menos doze que conheço já fizeram apresentações em outros países. O americano explicou como impactar menos o meio-ambiente com o manejo dos animais, o Argentino falou de biosseguridade e o suíço sobre o futuro do leite na Europa.
O local do evento foi a terceira novidade. Afinal, sou pesquisador da Embrapa e não me lembro de uma entidade que representa um setor ter feito um evento na sede da Empresa de maior credibilidade, em todo o mundo, quando o assunto é tecnologia para o agro nos trópicos. E, para a surpresa da Embrapa, a quarta novidade é que o evento presencial rompeu a barreira dos 500 inscritos, vindos de vários estados do Brasil. Um recorde!
Logo no início do evento, houve um painel temático que, por si somente, trouxe três novidades. Então, a quinta novidade foi o tema tratado. Afinal, Saúde Única e biosseguridade foram discutidas pela primeira vez no Brasil em um evento de produtores de leite. E você precisa saber o que é isso!
Eu fico feliz em ter participado da construção da sexta e da sétima novidades, porque iniciaram conosco, quando eu ainda era chefe-geral da Embrapa Gado de Leite. A sexta novidade foi saber que o Brasil passa a ter um pacote tecnológico disponível gratuitamente para produtores que queiram assegurar que o leite, os animais e as pessoas envolvidas com a produção estarão seguros, se adotarem os procedimentos recomendados.
A sétima novidade é o arranjo criado para se chegar a este pacote tecnológico, resultante da parceria entre Embrapa Gado de Leite, Boheringer e as fazendas Colorado e Santa Luzia. Esse arranjo é o que chamamos de inovação aberta, ou seja, produtor, empresa e pesquisador reunidos e se ajudando mutuamente para gerar uma solução inovadora.
Vivemos tempos bicudos, em que se valoriza discursos radicais. Muitos, somente querem conversar sobre o que acreditam, e não aceitam o contraditório. Pois, o Fórum da ABRALEITE trouxe a oitava novidade, ao colocar dois produtores muito diferentes para falar de soluções convergentes.
Makoto Sekita é grande produtor de beterraba, cenoura e alho. Portanto, faz uso de…agrotóxico. Já Joe Valle tem produção orgânica de hortaliças. Makoto tem gado holandês, Joe, Zebu. Makoto gosta de free stall, de compost barn. Já, Joe prefere gado a pasto. Um é grande, outro pequeno. Mas, ambos sabem usar os dejetos como recurso para produzir. E ambos sabem ganhar dinheiro com leite. Que aprendizagem nos legaram!
A nona novidade foi a apresentação de fontes alternativas de energia, com soluções distintas, do tipo biogás e energia solar. Em si, isso não é novidade. Mas, apresentada num mesmo evento, para produtores de leite? Ah! Isso é novidade!
A décima novidade foi trazer para o evento a discussão sobre mercado de capitais. Esse assunto é novo no Brasil, até nas atividades urbanas. Afinal, de todo o volume de empréstimos que ocorre aqui, apenas 20% são originários no mercado de capitais. O maior volume vem de empréstimos bancários, que são, em geral, pagos em um curto espaço de tempo, dificultando investimentos com retorno de longo prazo. Criar opções de obtenção de recursos via mercado de capitais para o leite é algo totalmente novo! E, fundamental!
A décima primeira novidade foi juntar, num só evento, simplesmente cinco especialistas em comportamento de mercados, para falar de produção e consumo de leite, de modo profundo, com visão de curto, médio e longo prazos. Além disso, eles lançaram (eu incluído), um olhar para os mercados interno e o internacional. E um deles com a visão diferenciada de quem não é do setor lácteo, mas entendido em consumidor. Um palestrante ensinou que não faz sentido ficar brigando com quem fala mal do leite. O caminho é ter propósito, mostrar que está preocupado com a natureza, com as pessoas envolvidas em todo o processo de produção e que o produto é limpo, nutritivo, saboroso.
A décima segunda novidade foram os comunicadores renomados, Tejon e Ricardo Nicodemus. Mostraram que não temos futuro se não decidirmos falar diretamente com o consumidor. Ele está menos predisposto a consumir leite. Precisamos agir coletivamente e apresentaram proposta concreta. Vamos agir?
Essas doze novidades configuram uma revelação: a ABRALEITE está madura, embora jovem! Fugiu de pautas velhas, agregando todos os de boa vontade em torno da construção do futuro. A ABRALEITE sai deste evento preparada para liderar este setor ainda carente. Lidere-nos, ABRALEITE!
*Economista, Doutor em Economia Aplicada, Pesquisador da Embrapa e Professor da FACC/UFJF